sexta-feira, dezembro 21, 2007



Boas Festas



E

Feliz Ano Novo

sábado, dezembro 15, 2007

Falar de pobreza VIII

Falar da pobreza, parece estar na ordem do dia, ainda que poucas pessoas procurem conhecer afundo o fenómeno. A pobreza não é uma doença súbita, é uma patologia lenta que nos vai consumindo sem darmos por isso e, um dia, podemos acordamos doentes. Talvez pareça excessivo, mas vou procurar fazer uma análise da evolução portuguesa ao longo dos últimos 100 anos. Tenho 66 anos de idade, o que me coloca na qualidade de observador de, pelo menos, meio século. Convido todos os que me visitam a participarem, não como um debate, mas uma tribuna aberta a todas as opiniões. Vale a pena perder um bocadinho do nosso tempo a pensar no assunto, pois o que se mostra no horizonte, não é nenhum mar de rosas.
Para a elaboração dos meus textos, vou-me socorrer da obra Portugal Século XX de Joaquim Vieira de onde recolherei textos, dados estatísticos e fotografias.


Década de 1970 a 1980


A Revolução

Estatística referente a 1970
População 8.663.252 (homens 4.109.360 47,4% mulheres 4.553.892 52,6%) (menores de 20 anos 3.182.750 36,7% maiores de 60 anos 1.242.910 14,3%)
Mortalidade infantil (por mil partos) 63,54
Esperança média de vida homens 64,2 anos
Esperança média de vida mulheres 70,8 anos
População de Lisboa 769.044
População do Porto 301.655
Analfabetos 25,6%
Emigrantes oficiais (por mil habitantes) 20,00
Eleitores inscritos 1.800.000
Escolas primárias 17.892
Estudantes do ensino primário 989.676
Estudantes do ensino secundário 120.373
Estudantes universitários 49.461
Automóveis em circulação 558.738

No acontecer de uma revolução popular, admitem-se acções que evitem fazê-la perigar, por muito drásticas que elas tenham que ser. O seu sucesso será medido pelas melhorias sociais que ocorrerão na população.

Não é porem um partido da oposição ou uma camada social a tomar a iniciativa de mudar o estado de coisas, mas sim um grupo de oficiais intermédios do Exército, que não queriam que a guerra continua-se a ter como solução a continuação dos combates.

Sugue-se a mais vertiginosa fase da história portuguesa do século XX, o tempo dos excessos e das utopias. Enquanto se desmantelam as velhas estruturas, a maioria julga que o poder se conquista na rua, enquanto ao mesmo tempo desenrola-se nos bastidores (mas à vista de todos) a decisiva disputa pelo controlo do país, quase levando a uma guerra civil.

Factura desse período conhecido como o PREC, claro, que tem de ser paga. Depois da embriaguez vem a ressaca e, os desmandos desse período: greves arbitrárias, subidas descontroladas de salários, quebra de rentabilidade do trabalho, indisciplina nas Forças Armadas e nas empresas, ocupação de tudo o que havia para ocupar, nacionalizações a esmo, Portugal é um país sem rei nem roque, para o qual os jacobinos da demagogia barata, não têm nenhuma solução, nem tão pouco as comissões de trabalhadores que gerem as fábricas com as suas próprias leis.
Mas a balda é tão grande, que as universidades são forçadas a aprovar estudantes por via administrativa!

A falta de investimento, que facilmente se depreende, que tal situação acarreta, a crise petrolífera e o decréscimo acentuadíssimo da emigração, que diminui drasticamente as remessas dos emigrantes, são três factores de peso que vão concorrer para o fim da ilusão de que o mundo também é nosso, se outros têm, também nós, apesar de não termos condições para isso, temos direito de ter, que resulta num apertar do cinto. A desilusão só não é total, por nos fazerem crer que falar sem restrições, é o elemento fundamental da liberdade, não enche a barriga, mas pelo menos é de borla.

Com o fim da guerra e a redução da emigração, o desemprego até aí insignificante, passa a fazer parte do nosso quotidiano, mas curiosamente, já nem todos os empregos servem, para os considerados “desprestigiantes” como trolhas da construção civil, são importados imigrantes de Cabo Verde.

Também outro facto concorre para o agravamento, da já grave situação, a descolonização em passo de corrida, que trás para Portugal milhares e milhares de “retornados”, à procura de uma nova vida.

A prosperidade aparente e prometida pelo PREC, esfuma-se na realidade de um país à beira, mais uma vez, da pobreza e, pobreza incrementa a miséria.

Não é por nas cidades as mulheres mostrarem as pernas e eles deixarem crescer o cabelo, o bigode e barba, que a sociedade mudou, nem o tacho em casa fica mais cheio, nem tão pouco evita uma inflação galopante que vai tornando as pessoas cada vez mais pobres. Pela primeira vez, desde algumas décadas, a classe média sente-se atingida pela crise.

Sem soluções o MFA vê-se na necessidade de passar o poder político para os partidos, esses ilustres desconhecidos, que além do PC, praticamente ninguém conhecia. Com as eleições à vista, os partidos afirmam-se com a promessa. Prometem o que podem e não podem, juram a prosperidade imediata, oferecem a Lua. O povo sem qualquer formação cívico/política, frenético grita agitando o seu voto no ar. Quem dá mais, quem dá mais?

Os habitantes da Mitra de Lisboa, nas vésperas de Natal de 1978

A Liberdade chegou, mas a pobreza não arredou pé! E a prova disso é que em 1978 a Mitra de Lisboa, o símbolo maior da nossa miséria, ainda executa a sua função.







domingo, dezembro 09, 2007

Falar de pobreza VII

Falar da pobreza, parece estar na ordem do dia, ainda que poucas pessoas procurem conhecer afundo o fenómeno. A pobreza não é uma doença súbita, é uma patologia lenta que nos vai consumindo sem darmos por isso e, um dia, podemos acordamos doentes. Talvez pareça excessivo, mas vou procurar fazer uma análise da evolução portuguesa ao longo dos últimos 100 anos. Tenho 66 anos de idade, o que me coloca na qualidade de observador de, pelo menos, meio século. Convido todos os que me visitam a participarem, não como um debate, mas uma tribuna aberta a todas as opiniões. Vale a pena perder um bocadinho do nosso tempo a pensar no assunto, pois o que se mostra no horizonte, não é nenhum mar de rosas.
Para a elaboração dos meus textos, vou-me socorrer da obra Portugal Século XX de Joaquim Vieira de onde recolherei textos, dados estatísticos e fotografias.




Pai recebe medalha no 10 de Junho pelo filho que não voltará

Década de 1960 a 1970

Tempo de guerra

Estatística referente a 1960
População 8.889.392 (homens 4.254.416 47,9% mulheres 4.634.976 52,1%) (menores de 20 anos 3.339.180 37,6% maiores de 60 anos 1.042.588 11,7%)
Mortalidade infantil (por mil partos) 23,53
Esperança média de vida homens 58,4 anos
Esperança média de vida mulheres 67,1 anos
População de Lisboa 802.230
População do Porto 303.424
Analfabetos 30,3%
Emigrantes oficiais (por mil habitantes) 3,68
Eleitores inscritos 1.294.779
Escolas primárias 17.892
Estudantes do ensino primário 868.625
Estudantes do ensino secundário 101.969
Estudantes universitários 32.163
Automóveis em circulação 184.257

«Sinto que apenas pode haver soldados e marinheiros portugueses vitoriosos ou mortos»
Salazar, Dezembro de 1961

Chega a Portugal o tempo das grandes roturas. Uma época em que parecia não soprar a mais leve aragem no país, sucedem-se movimentos sociais que assumem proporções bíblicas para uma pequena nação como Portugal: um milhão de emigrantes partem para o estrangeiro, especialmente França, centenas de milhares de camponeses mudam-se para as grandes periferias urbanas, 100.000 militares envolvidos na guerra.

A nação atravessa o período de mais rápido crescimento económico em toda a sua história até à data. Iniciado na década anterior, o expansionismo industrial e comercial é puxado pelos fios invisíveis que regulam a economia e que o poder político já não consegue dominar.

Bem pode Salazar esquecer a sua nostálgica visão bucólica «Quero este país pobre mas independente; não o quero colonizado por capital americano.»

Ao mesmo tempo que entra no mundo industrializado, Portugal liberaliza a economia, aproximando-a das regras do mercado capitalista complexado.

Os laços económicos com África, à medida que a guerra progride, vão desfazendo-se enquanto que o comercio com a EFTA aumenta, passando de 43 para 65%.

Os compradores estrangeiros descobrem em Portugal a árvore das patacas, os baixos salários são a motivação de passarem a ser importadores e exportadores ao mesmo tempo.

O agravamento da situação colonial e, consequente degradação do pilar das nossas exportações, acaba por levar o próprio Governo a criar condições especiais para atrair o capital estrangeiro afim de evitar um desemprego catastrófico.

Os investimentos estrangeiros começam a entrar em catadupa pelas portas dentro, as fábricas nascem como cogumelos, aliciadas pela mão-de-obra barata que, conforme a Europa se vai recompondo da Segunda Grande Guerra, mais barata se vai tornando.

Este investidor estrangeiro não trás riqueza para Portugal, a maior parte da produção é “à façon”, isto é, em Portugal só ficam os magros salários dos operários, porque se por um lado as matérias prima são importadas em regime de Importação Temporária, isentas de direitos alfandegários e, reexportadas como produto acabado, por outro, o valor acrescentado ao preço de custo dos produtos manufacturados é zero, pois exportador e importador é a mesma pessoa, havendo ainda muitas benesses fiscais. Um negócio da China para a estrangeirada que vem enriquecer com a nossa pobreza. Os protagonistas são os ingleses, que aproveitando o que foi dito anteriormente, transformam Portugal no principal produtor têxtil da Europa.

As fábricas do sector têxtil e do calçado, onde o trabalho é pago à peça, empregam principalmente mulheres aquém, por a oferta ser superior à procura, leva a aceitarem salários muito baixos e condições desumanas de trabalho. As crianças passam a estar na mira destes industriais aquém podem pagar ainda menos, ainda que desempenhem as mesmas funções.

Emigrante que regressa para casar

Se as mulheres, na precariedade e miséria salarial, ainda conseguem angariar alguma subsistência, já os homens se vêm a braços com o desemprego, provocado pelo encerramento das fábricas que dependiam das exportações para África. Para que a fome não passe a fazer parte da família, só lhes resta uma solução, legalmente ou a “salto” emigrar. Para trás fica tudo o que faz a identidade humana: a família, a terra, os amores o convívio, a cultura e a nação. Também estes, na sua maior parte, vão conhecer as agruras do trabalho clandestino no estrangeiro.

É um processo de desertificação demográfica, que causa o despovoamento de campos e aldeias. O êxodo, sobretudo na segunda metade da década, penaliza as regiões do interior contribuindo para o envelhecimento da população rural.

Surdo aos apelos conciliadores dos nacionalistas africanos, às soluções negociadas e a quem quer que fale de autodeterminação ou até de um possível ensaio de federação lusófona com autonomia das colónias, Salazar vive obstinadamente a solução militar.

“Angola é nossa” é a música de abertura da TV e, a população chocada com os iniciais massacres cometidos pela guerrilha, está atordoada e o Governo explora os sentimentos nacionalistas, porque é Portugal que está a ser atacado. Paradoxo, longe de derrubar a ditadura, é a guerra que mantém a ditadura.

Com a guerra e a sangria da emigração, ocorre um fenómeno de desenvolvimento social dos trabalhadores. As indústrias, por causa das acessibilidades e angariação de mão-de-obra, concentram-se no litoral e em especial à volta de Lisboa e Porto. O desenvolvimento destas cinturas industriais reclama mais trabalhadores, aos quais acenam com salários mais convidativos em virtude da escassez provocada pela guerra e a emigração. O governo teme que a escassez de mão-de-obra, provoque uma escalada na subida dos salários, por isso procura controlar a emigração, tornando crime a ilegal.

Os campos perante este novo facto, despovoam-se ainda mais e cava-se um grande fosso entre o litoral e o interior. A agricultura estagna enquanto se acentua o crescimento industrial.

Nesta década a mulher conquista, devido à sua contribuição para o rendimento familiar, um novo estatuto, contudo, ainda tem de ir à missa de véu e meias pretas e, uma vez casadas, de pedir autorização ao marido para abrir uma conta bancária, montar um negócio, tirar passaporte ou viajar ao estrangeiro, além de que precisa, para votar, de possuir um curso médio ou superior.

O reflexo deste esbatido desenvolvimento é a expansão das classes médias, o pretendido espelho regime, com as suas aspirações próprias e novas exigências de consumo. Vêem televisão, lêem revistas e jornais, fazem comparações com o estrangeiro, abrem-se aos novos costumes, seguem a moda e inquietam-se pela lentidão das transformações da sociedade,


Com a estagnação da agricultura, agrava-se a dependência nacional da importação de produtos alimentares, para onde são canalizadas grande parte das divisas recebidas dos emigrantes, que se torna uma grande negócio tendo em conta o aumento do consumo das classes médias. Também a classe média adoptou um novo estatuto social: o automóvel. O incremento do comércio a prestações, faz esquecer a debilidade dos rendimentos e aumenta a dependência, o dispensável passou a ser indispensável.

Todos simpáticos! Vêem aí os turistas, são precisas muitas divisas para se gastarem nas importações.

Mas enquanto isto, o mundo gira e o homem chega à lua e, os Beatles e os Roling Stones mudam os comportamentos e, nós por cá gritamos.
Somos os maiores! Viva o Benfica.
Somos os maiores do mundo! Vivam os “Magriços”
Sonhar é fácil, desde que não se tenha de encher a barriga.

Mas mesmo sem querer, os tempos mudam. Salazar por fim não governa. O que não fomos capazes de fazer, fá-lo uma simples cadeira, farta do rabo dele. Que fique a lição ao menos.
Marcelo descomprometido, ambíguo, televisivo, aparece em cena. Quer agradar a todos, mas não agrada a ninguém, enquanto a pobreza resiste.






domingo, dezembro 02, 2007

Falar de pobreza VI

Falar da pobreza, parece estar na ordem do dia, ainda que poucas pessoas procurem conhecer afundo o fenómeno. A pobreza não é uma doença súbita, é uma patologia lenta que nos vai consumindo sem darmos por isso e, um dia, podemos acordamos doentes. Talvez pareça excessivo, mas vou procurar fazer uma análise da evolução portuguesa ao longo dos últimos 100 anos. Tenho 66 anos de idade, o que me coloca na qualidade de observador de, pelo menos, meio século. Convido todos os que me visitam a participarem, não como um debate, mas uma tribuna aberta a todas as opiniões. Vale a pena perder um bocadinho do nosso tempo a pensar no assunto, pois o que se mostra no horizonte, não é nenhum mar de rosas.
Para a elaboração dos meus textos, vou-me socorrer da obra Portugal Século XX de Joaquim Vieira de onde recolherei textos, dados estatísticos e fotografias.



Década de1950 a 1960


O imobilismo

Estatística referente a 1950
População 8.510.240 (homens 4.120.184 48,4% mulheres 4.390.056 51,6%) (menores de 20 anos 3.299.049 39,1% maiores de 60 anos 883.854 10,5%)
Mortalidade infantil (por mil partos) 98,00
Esperança média de vida homens 54,7 anos
Esperança média de vida mulheres 60,0 anos
População de Lisboa 783.226
População do Porto 281.406
Analfabetos 40,4%
Emigrantes oficiais (por mil habitantes) 2,49
Eleitores inscritos 1.128.198
Escolas primárias 8.707
Estudantes do ensino primário 645.755
Estudantes do ensino secundário 46.490
Estudantes universitários 12.771
Automóveis em circulação 73.523

“Sinto ter de pensar que não estamos a caminhar a não ser do avesso”
D. António Ferreira Gomes, bispo do Porto, em carta a Salazar (1958)

Na aparência, Portugal apresenta-se nos anos 50 tão estático quanto um glaciar. O País retoma o «viver habitualmente», que é a maior ambição de Salazar. O ditador, eliminadas as ameaças que punham em causa o seu monopólio do poder, vai a caminho dos 70 anos e, já não é homem para grandes reformas capazes de apagar o crónico atraso lusitano.
As Nações Unidas revelam que cada português vive em média com 2400 calorias, menos 100 que o mínimo considerado indispensável. Os deputados do próprio partido único, admitem na Assembleia, não só um elevado índice de mortalidade infantil, devido à deficiente alimentação e das condições de vida, como a persistência da tuberculose, sobretudo ao Norte.
A avalanche emigratória retorna, estimulada pela prosperidade do mundo industrial do pós-guerra e, volta a ser o paliativo para a miséria portuguesa, não deixando de crescer ao longo do decénio. Entre 1950 e 1960 são visíveis as reduções da população em quase todos os distritos, com excepção de Lisboa, Setúbal, Leira e Santarém, devido à sangria migratória.

A solução da maior parte dos males sociais portugueses poderia passar pela industrialização do país, acompanhando o crescimento europeu dos anos 50. Mas o presidente do Conselho passa esses anos todos sem saber se Portugal é um país agrícola ou industrial.

Dizendo-se interessado no crescimento de uma forte classe média, Salazar aconselha porém prudência na industrialização, receando o fecho das pequenas unidades crie uma crise de emprego. As fábricas só vêm conspurcar o seu bucólico idealismo e quanto menos e mais tarde melhor. “A agricultura, pela sua maior estabilidade, pelo seu enraizamento natural no solo e mais estreita ligação com a produção de alimentos, constitui a garantia por excelência da própria vida, devido à formação que imprime nas almas, manancial inesgotável de forças de resistência social” (Salazar numa conferência em 1953). “Aqueles que não se deixam obcecar pela miragem do enriquecimento indefinido, mas aspiram, acima de tudo, a uma vida, embora modesta, seja suficiente, sã, presa à terra, não poderiam nunca (…) seguir por caminhos em que a agricultura cedesse à indústria.”

Este bucólico dirigismo do governo, se por um lado inspira a pequena e artesanal indústria, por outro propícia cada vez mais a auto determinação, cada vez mais egoísta, dos senhores da terra. A indústria, tal como hoje, era o factor fundamental do desenvolvimento, sem produção não há riqueza e, sem riqueza para distribuir, nunca poderá haver um progresso sustentado do melhoramento das condições sociais.

Em ambos os casos, os assalariados da indústria e do campo, continuam a ver a sua condição social cada vez mais degradada, agora também, comparativamente ao novo sector emergente, as cidades. É um Portugal a dois tempos, o faz de conta e o que não conta.

A elite industrializante do país em 1957, reclama o aceleramento do ritmo de desenvolvimento. Aí Caetano teve a ousadia de evocar a conveniência da integração europeia para a abertura de novos mercados e à necessidade de maior protagonismo da iniciativa privada, em detrimento do dirigismo estatal, que levava à reprovação de mais de metade dos pedidos para abertura de novas fábricas e empreendimentos económicos, enquanto o grosso do desenvolvimento económico se faz à sombra do proteccionismo oficial, de baixíssimos salários e uma mão de obra pouco qualificada.

Só no final da década, as palavras de Caetano fizeram eco. A adesão à Associação Europeia do Comércio Livres (EFTA), um grupo de países que procuraram eliminar barreiras alfandegárias. Neste eco a industria portuguesa dá o seu primeiro grande impulso, passa pela primeira vez a parte principal do produto nacional, com uma taxa de crescimento anual de 4,4%. Consequentemente a população activa rural decresce enquanto a industrial aumenta. Há uma acentuada diminuição das pequenas indústrias artesanais em benefício das grandes concentrações industriais.

Mas esta diáspora do campo para as cinturas industriais, na maioria dos casos, não reflecte uma melhoria de vida, pois se ganham mais, também as despesas são maiores. Os bairros da “lata” passam a ser o ex libris das cidades, especialmente Lisboa. Contudo, uma população mais urbana é uma população mais informada, que melhor pode perspectivar o bem-estar. O reflexo imediato é uma acentuada descida das taxas de natalidade e de mortalidade, começando a percentagem da população jovem a diminuir, o país começou a envelhecer.

África de esquecida, passa a protagonista. Um forte proteccionismo aos produtos da metrópole, levam-na a ser o maior importador da produção nacional. A força dos ventos anticolonialistas obrigam as colónias a passarem a províncias e ao reforço do seu povoamento. Uma vez mais as promessas são a esperança dos rurais, que passam a desviar a rota da sua emigração, para a África, onde grandes empreendimentos, os tornariam prósperos em pouco tempo. É a época da grande ilusão do Vale Limpopo e outras. Terras férteis, óptimas colheitas, mas um só comprador, que pagava o preço que queria.

Os anos 50 herdaram os extremos de miséria da década anterior, que apesar do lento desenvolvimento, alguma melhoria passa para a década seguinte. É graças à emigração, que volta em força, que permite de norte a sul, do continente e ilhas, o relativo bem-estar de muitas famílias e o esvaziamento das tensões sociais. Contudo a “Mitra” persiste.

A vida política nacional também estagnou. O aparelho policial e censório atinge a plenitude, poucos ousam desafiá-lo. Instá-la se o servilismo e a subserviência entre quem quer fazer carreira ou simplesmente a estabilidade no emprego. Está instituída a delação, que milhares e milhares de portugueses praticam sem embaraço, como informadores da PIDE e da Legião Portuguesa.

Toda a gente tem medo – medo de alguém ou de qualquer coisa, medo de V. Ex.ª. e da sua gente” (carta aberta a Salazar de Henrique Galvão, primeiro presidente da Emissora Nacional)

Nesta década morre Carmona e o novo presidente é Craveiro Lopes.
“Demito-o, obviamente” é aragem de liberdade anunciada por Humberto Delgado.