sexta-feira, outubro 26, 2007

Falar da pobreza

Falar da pobreza, parece estar na ordem do dia, ainda que poucas pessoas procurem conhecer afundo o fenómeno. A pobreza não é uma doença súbita, é uma patologia lenta que nos vai consumindo sem darmos por isso e, um dia, podemos acordamos doentes. Talvez pareça excessivo, mas vou procurar fazer uma análise da evolução portuguesa ao longo dos últimos 100 anos. Tenho 66 anos de idade, o que me coloca na qualidade de observador de, pelo menos, meio século. Convido todos os que me visitam a participarem, não como um debate, mas uma tribuna aberta a todas as opiniões. Vale a pena perder um bocadinho do nosso tempo a pensar no assunto, pois o que se mostra no horizonte, não é nenhum mar de rosas.
Para a elaboração dos meus textos, vou-me socorrer da obra Portugal Século XX de Joaquim Vieira de onde recolherei textos, dados estatísticos e fotografias.


Aguadeiras de lisboa aguardando vez para encher as bilhas no chafariz

Decada de 1900 a 1910

Os últimos anos da monarquia


Estatística referente a 1900

População 5.423.132 (homens 47,8%, mulheres 52,2%) (menores de 20 anos 43,2%, maiores de 60 anos 9,5%)
Excesso nascimentos/óbitos 54.915
População rural 3.367.199 (62,1%)
População industrial 1.034.203 (19,1%)
População das cidades 853.037 (15,7%)
Lisboa 378.083
Porto 173.020
Analfabetos 4.261.336 (78,6%)
Emigrantes oficiais 21.227
Eleitores inscritos 630.000
Funcionários públicos 50.099
Escolas primárias 4.600
Estudantes do ensino primário 231.239
Estudantes do ensino secundário 5.023
Estudantes universitários 2.736
Ordenado dos professores primários 15$000
Automóveis em circulação 177

“A democracia, entregando o poder às classes liberais e emancipando-o da casta, resumiu o papel social da fidalguia”
Carlos Malheiro Dias, Cartas de Lisboa, 1904.

Enquanto a Europa festeja a entrada no século XX, Portugal conserva-se escondido e ignorado ao canto da Península Ibérica. É um modesto país, pequeno e pobre, dominado por um sufocante poder clerical, onde sobrevive um regime de monarquia constitucional, ainda em vigor em 1900.
Numa população de cinco milhões e meio de almas, sete em cada dez vive ainda em freguesias rurais e, dessas quase 90% dependem da actividade agrícola. A luz e o ferro, símbolos do século que terminou, ainda não chegaram.

Só em meados do século XIX são montadas as primeiras fábricas, na sua maioria pertença de estrangeiros. Os tabacos e os têxteis são o produto de uma tardia chegada da revolução industrial, mas sectores fundamentais como a metalurgia são inexistentes. O país é pobre em recursos energéticos para estas indústrias a vapor. A produtividade fabril é cerca de metade da dos países industrializados. Quase todas as indústrias resultam do crescimento das actividades artesanais que servem o mercado da metrópole e das colónias. A população industrial em 1907 não vai além dos 86 mil, dos quais 45 mil são homens, 26 mil mulheres e 15 mil menores. O maior empregador é a indústria têxtil. Um trabalhador significa pouco mais que um bem material posto à livre disposição do patrão para produzir. A lei é quase inexistente no que respeita às condições de trabalho e aos direitos dos assalariados.
A produção de bens, dispersa por muitas indústrias pequenas e artesanais, não responde ao consumo interno. Em 1900, 87% dos produtos que circula nos portos portugueses é de proveniência estrangeira. Exporta matérias – primas e produtos da terra, como o vinho do Porto (este em mãos inglesas).

A revolução industrial cava um profundo fosso entre proprietários e assalariados. É difícil a existência da gente pobre nos campos e nas cidades. Como último recurso, recorre-se à emigração, que pontua a vida social e económica do país.


O progresso pouco contribui para melhorar as condições de vida e, por isso muitos emigram, especialmente vindos das zonas agrícolas, onde por salários de miséria, são obrigados a trabalhar do nascer ao pôr-do-sol. Portugal prepara-se para conhecer a maior hemorragia da sua história. O destino mais sedutor é o Brasil, excepto para os açorianos que preferem as costas dos Estados Unidos. As remessas daí provindas, constituem uma componente essencial do orçamento do Estado e garantem a sobrevivência de milhares de famílias.

Com uma classe média exígua, a estratificação da sociedade portuguesa nos alvores do século é de um contraste radical. Às centenas de famílias que concentram o grosso do poder, da grande propriedade e do dinheiro, opõe-se um exército de desventurados composto por milhões de indivíduos, mal vestidos, mal alojados, mal medicamentados, mal educados e mal assistidos.

Mesmo numa época de crescimento quase primitivo, há sempre quem consiga aproveitar-se da miséria para fazer fortuna. Henry de Burnay, é o protótipo do capitalista, de poder financeiro ilimitado e cupidez desmedida. Duquesa de Palmela, herdeira do título, simboliza o renascer do poder da aristocracia. Grande latifundiária, possui além de terras, inúmeras propriedades urbanas. José Palha Blanco, o mais abastado lavrador do Ribatejo, representa o imenso poder dos grandes proprietários de terras. António Carvalho Monteiro, à frente de um empório comercial, é o mais bem sucedido dos “brasileiros”, emigrantes que regressam com fortuna. É o construtor da Quinta da Regaleira. Francisco Grandella, renovador do comércio a retalho è acusado de vender mercadorias de contrabando, devido aos baixos preços que praticava. Alfredo Silva, mercê de um monopólio de exclusividade e proteccionismo, funda o maior império industrial, partindo da fabricação de sabão. A CUF.

A lenta mas irreversível industrialização, aliada ao regime representativo – que obriga à captação de votos para se ser alguém na política e partilhar do poder – está a provocar uma alteração social subterrânea, quase imperceptível mas definitiva. Quem tem fortuna – e logo influência – já não é apenas a aristocracia (muitas vezes arruinada), mas também a classe empresarial emergente: banqueiros, industriais, importadores, grandes comerciantes e especuladores.

Desde há algum tempo, que no Executivo alternam com rigor rotativo, elencos dos dois grandes partidos portugueses – Regenerador e Progressista. S. Bento é um palco para exibição de tenores. Fazer política é conhecer os dotes da oratória, mais do que saber tomar decisões acertadas para a vida do país.

A província degrada-se mas Lisboa vive na euforia do crescimento, onde os desafortunados do campo chegam em massa. O crescimento é imparável. Destroem-se hortas e casebres. Em 1904 Malheiro Dias escreve: “O pobre foi escorraçado de todos os locais saudáveis e arejados, tangido para Xabregas, para Alcântara, para a Mouraria e para Alfanma. E a Lisboa dos ricos desenvolve-se, prospera, aformoseia-se. Milhares de operários trabalham incessantemente, há quatro anos, em todas as avenidas, na construção de prédios para alojamento dos ricos. (…) O capital está atacado pelo delírio da construção. (…) uma feira de especulação, onde a ganância assentou arraiais e arvorou a sua bandeira.”

Lisboa torna-se comodista, quer tudo à porta, embora pague mais e a qualidade seja duvidosa. O padeiro, o leiteiro (que mugia a vaca na presença do freguês), os aguadeiros, o marçano, a varina, a mulher da fruta, a mulher da hortaliça, a lavadeira que circulava com burros ou carroças, todos lhe batiam à porta. Nas ruas acumulam-se os dejectos dos animais, os lixos mais a água atirada das casas por não haver saneamento. A estes comerciantes ambulantes juntam-se alguns milhares de crianças de rua e das gentes na espera de biscates, muitos deles conhecidos por galegos.
Os mendigos povoam as zonas urbanas, assim como gente a vasculhar o lixo e pessoas sem trabalho ou sem vontade. As casas de penhores são frequentes nos bairros pobres.

O sofrimento dos infortunados começa na infância. Um bebé é mais uma boca para alimentar, o que significa que deve ser (posto na roda) abandonado ou posto a render o mais cedo possível. Impressiona não só a nudez, o pé descalço, os remendos, a insuficiência alimentares, a promiscuidade no alojamento, mas também a luta das crianças pela sobrevivência. São atiradas à rua pelos pais para comporem o orçamento familiar, ignorando a escolaridade obrigatória.

A electricidade tarda em chegar e mesmo quando é instalada em Lisboa, os candeeiros a gás são mantidos, como única iluminação a partir da 1 hora da madrugada. Em 1908 só existiam 293 candeeiros eléctricos nas ruas de Lisboa.

As estradas ainda não estão preparadas para receber os primeiros veículos a motor: leva-se dois dias para ir de carro de Lisboa ao Porto.

domingo, outubro 21, 2007

Flashes americanos (II)

Os ícons

A primeira grande febre económica que os Estados Unidos conheceram foi a dos caminhos-de-ferro. O negócio era de tal maneira lucrativo, que levou as companhias a trabalharem nos mesmos percursos, instalando vias ao lado de outras. Com o comboio começou a grande colonização do Oeste, empurrando a Fronteira de Turner até ao Pacífico. Foi a época dos grandes rancheiros, dos grandes agricultores e dos prospectores de riquezas naturais, mas também foi a época do grande genocídio dos Índios, que em pouco tempo se viram desapossados dos seus territórios e, os que sobreviveram, enjaulados em paupérrimos e diminutos territórios demarcados, com um estatuto parecido aos de prisioneiros de guerra, isto é, sem quais direitos. A estes, os verdadeiros americanos, nunca chegou qualquer tipo de Constituição.
É nesta época que também rebenta o primeiro grande caso de fraude à americana.
A “O Union Pacific” acabava de unir os Estados Unidos de costa a costa, quando a companhia deu sinais de penúria, prelúdio de uma próxima bancarrota. Em contrapartida, uma outra sociedade, recentemente criada para construir a via-férrea em questão, o Crédito Mobiliário, tinha lucros fabulosos pagando dividendos aos accionistas de 248%. Segundo Jean Canu, “adivinha-se a associação fraudulenta que os promotores comuns das duas empresas haviam organizado entre si, de maneira a açambarcarem os lucros e fazerem o público suportar os encargos. Para cobrir com a sua autoridade este gigantesco ardil, ministros, senadores, representantes e até o vice-presidente Colfax, receberam a sua quota-parte de acções e benefícios.”
Apesar de todas as vicissitudes, o comboio foi o motor do desenvolvimento da economia americana, permitindo o escoamento dos produtos do interior.
Um dia em Agosto de 1859, em Titusville, o petróleo apareceu pela primeira vez à luz do dia e, pouco tempo foi preciso para passar do simples uso na iluminação, para o produto mais procurado. Com o petróleo nasce um dos ícones da América, John D. Rockefeller.
De origem muito modesta, filho de um vendedor ambulante de mesinhas milagrosas, aos vinte e seis anos de idade, depois de passar por diversos negócios menores, toma conhecimento do ouro negro e das suas potencialidades. Ambicioso, voraz, sem escrúpulos, tem um objectivo, controlar todo o negócio petrolífero e, assim evitar as superproduções para poder manter o preço. “Meticulosamente”, começa a construir uma empresa que sujeitava todos os industriais do petróleo, quer extractores quer refinadores, ao seu poder e, em 1870 Rockefeller lança as bases do seu império ao fundar a Standard Oil Company que passará a controlar a maior parte das refinarias norte americanas. Para os seus negócios se expandirem de estado em estado, teve de conseguir ultrapassar a lei que proibia os homens de negócios de exercerem a sua actividade fora do estado onde residiam. Assim nasceu o famigerado trust. A sua fortuna, pouco antes da Primeira Guerra Mundial cifrava-se em 900 milhões de dólares.
Falar de aço, é falar de Andrew Carnegie. Filho de um pobre emigrante escocês, aos 12 anos já trabalhava numa fábrica com o salário de 1,20 dólares por semana. Em seguida foi distribuidor de telegramas, chegando a telegrafista, entrou depois numa companhia ferroviária. Em 1859, com 24 anos, era nomeado chefe de secção na Pensylvania Rail. Depois, como acontecia na América, conseguiu fundar a sua própria companhia a Carnegie Steel Cy, que em poucos anos conseguiu o predomínio sobre as outras companhias do ramo. Carnegie tinha tanto de gentleman na vida privada, como dureza nos negócios. Os caricaturistas gostavam de o representar como uma aranha no meio da sua teia imensa. Em questões de dinheiro, os escrúpulos nunca o embaraçaram. 1900 marcou o princípio de uma verdadeira guerra, “a guerra do aço”. Algumas firmas, apesar de antigos clientes, deixaram de súbito de lhe comprara o aço e, numa tentativa de fugirem ao seu monopólio, fabricarem elas próprias o seu aço. A resposta de Carnegie foi rápida e brutal. Construção de fábricas destinadas a concorrer com os dissidentes até estes falirem. Ou lhe vendiam os negócios, ou ele os inviabilizava pela via da concorrência desleal.
Contar dólares sem falar de John Pierpont Morgan, não faz sentido. Não gostava de Carnegie nem de Rockefeller. Não podia gostar de homens tão ou mais poderosos do que ele. Queria ser um príncipe do Renascimento, o Lourenço-o-Magnífico, do século XX. Morgan prodigalizava os dólares de tal maneira, que ninguém duvidava de que ele governava os Estados Unidos. Com um nariz vermelho e inchado por afecção dermatológica incurável, olhar intenso e frio, era astucioso, desconfiado, hábil, impaciente e muito rápido nas decisões que nem sempre contemplavam os escrúpulos. A guerra ofereceu-lhe a oportunidade de ensaiar alguns negócios não muito escrupulosos, mas muito lucrativos; em seguida, começou a vender na Europa obrigações de Estado americanas. Os seus rendimentos cedo adquiriram um montante espantoso. Entra no negócio do aço e dos caminhos-de-ferro. Tornou-se senhor de um poderoso império ferroviário e inimigo terrível da livre concorrência, um especialista em monopólios. A sua influência em Wall Street era enorme, Wall Street tremia diante dele.
Em 1895, Morgan teve a oportunidade de reforçar a sua ingerência no Governo dos Estados Unidos, quando este se encontrava a braços com graves dificuldades financeiras: saneou as finanças da União venceu a crise e elegeu-se rei. Mais tarde, em 1907, nova crise fez Wall Street tremer. De um dia para o outro, os grandes bancos encontrava-se à beira da falência e, milhões de clientes viam as suas economias ameaçadas. Chamou os banqueiros e impôs-lhes uma mobilização de capitais para apoiar as firmas em perigo, salvou a bolsa do pânico dando o exemplo comprando uma grande empresa em situação muito delicada. Trabalhando de dia e de noite, convencendo, ameaçando ou chantageando, saiu vitorioso e a América suspirou de alívio. O seu estatuto de nobreza estava assegurado. Vivia num fausto de meter inveja aos príncipes. De livro de cheques na mão percorria a Europa e, os Rubens, Rembrandts, Velásquez e todas as outras preciosidades da arte europeia, começaram atravessar o Atlântico.
Quando morreu em 1913, ao abrirem o testamento podia-se ler. “Deponho a minha alma nas mãos do Senhor, na plena convicção de que, após a ter purificado no Seu precioso sangue, Ele a apresentará isenta de qualquer mácula ao Pai Celeste. E dou por missão aos meus filhos, ainda que isso lhes possa custar alguns sacrifícios, a perpetuação e a defesa da santa doutrina do perdão das faltas pelo sangue de Jesus Cristo”.
Na mesma prateleira podem ser colocados muitos outros personagens americanos, que inspiraram as gerações futuras, quando estas passaram a trocar o doméstico sonho americano, pelo sonho de senhores do Mundo.
Para efectuar este trabalho, recorri aos meus apontamentos sobre a História dos Estados Unidos, compilados quando do estudo da mesma, extraídos de diversos compêndios de História.

sábado, outubro 13, 2007

Flashes americanos ( I )

Quando hoje em dia vimos a actuação americana no mundo, estamos muitas vezes longe de saber a sua causa, limitando-nos a observar o efeito. Um império tem sempre uma origem, não se forma por obra do acaso, por isso a sua sobrevivência terá de obedecer sempre aos princípios que o estabeleceram. Vou em alguns pots, para aqueles que acham que o conhecimento das coisas é primordial para a formulação de juízos, apresentar numa cronologia aleatória, alguns resumos de passagens da história americana, que mais concorreram para o espírito que norteia a políticas norte americana na actualidade. Para tal trabalho, recorri aos meus apontamentos sobre a História dos Estados Unidos, compilados quando do estudo da mesma, extraídos de diversos compêndios de história.

Os Reis do Dólar

Depois da guerra civil, um comité de quinze pessoas adquiriu uma influência decisiva sobre o Congresso. A alma deste pequeno grupo era Thaddeus Stevens, que determinou a política do Norte triunfante. O Sul devia ser castigado, tratado como um país conquistado, despojado de todo o poder político no sei dos Estados Unidos.
Segundo Knut Hamsun, norueguês que viveu muito tempo nos Estados Unidos, opinião expressa em livro editado em 1889, a guerra civil não tivera como objectivo a libertação dos escravos, mas despojar os aristocratas do Sul. A ruína dos aristocratas meridionais foi efectivamente consequência da guerra.
Thaddeus Stevens, sucessor de Lincoln, reinava em Washington com os seus republicanos, adepto desta política de terra queimada, o seu lema era o ódio, que foi personalizado pelos cinco generais encarregues da “pacificação” do Sul. Foi uma verdadeira ocupação militar. Os tribunais civis substituídos por tribunais militares, demitidos todos os funcionários democratas, o Congresso fechado aos aristocratas do Sul, as associações dissolvidas e as fortunas confiscadas.
Andrew Johson fez todos os possíveis para contrariar esta repressão brutal. Foi acusado de não cumprir os seus deveres de presidente e levado ao congresso para responder pelos seus actos. Este processo, na Primavera de 1868, foi de uma violência inaudita e Johson, foi ilibado por fraquíssima maioria.
Sucede-lhe Ulysses Grant, o general triunfador de Appomatox.
O ódio ardia também no Sul oprimido. Contra o governo de Washington, contra as tropas de ocupação, contra os carpetbaggers vindos do Norte para explorar o Sul de todas as maneiras possíveis, sob a protecção das baionetas federais; ódio também e, sobretudo, pelos “colaboracionistas” meridionais, os scalawags.
A América tinha em Ulysses Grant um dos seus melhores generais, mas como se veio a verificar também, um dos seus piores presidentes. Grant não percebia nada de política e não possuía a mínima noção de economia. Instalado na presidência, manteve-se completamente alheio, às transformações quase revolucionárias que se operavam na América, contudo ele encarnava, no Norte, o carácter triunfante dos republicanos, que toleravam todas as loucuras da especulação. Durante a guerra a especulação fora as armas, onde os do Norte obtinham grandes lucros no momento exacto que os boletins de informação forneciam o número de vítimas das batalhas. Mas a paz viu outros especuladores mais hábeis e mais brutais. Da guerra saiu uma paz que fazia do Norte o paraíso dos homens sem escrúpulos.
(O mundo, após 1865, transformou-se num mundo de banqueiros e na “era das lantejoulas”, aludindo ao orgulho, ao luxo e ao egoísmo provocante dos privilegiados da fortuna”), segundo alguns cronistas da época.
Mark Twain que passou algum tempo da sua juventude junto dos pioneiros do Oeste, disse a esse propósito do Estado do Nevada: “Esta região é fabulosamente rica em ouro, prata, cobre, chumbo, carvão, ferro, ladrões, assassinos, mulheres, crianças, advogados, cristãos, índios, chineses, espanhóis, jogadores profissionais e pregadores religiosos. É com mil demónios, a região mais incrível da Terra.” Esta é a América durante o período que vai da guerra civil ao fim do século.
A América estava na sua “era dourada”. Os homens que ascenderam ao poder depois da guerra revelavam-se paradoxais. Queriam, por um lado, que a sociedade deixasse ao indivíduo a maior liberdade possível e, por outro, essa mesma sociedade protegesse os seus interesses pessoais da maneira mais eficaz. Em negócios, mostravam-se isentos de todos os preconceitos; mas mostravam-se devotos na igreja, membros fiéis das suas respectivas congregações. Veneravam o dólar, mas se por acaso, abriam algum livro, era, na maior parte das vezes, a Bíblia. Todos os homens de negócios se consideravam como fazendo parte da classe social mais importante e, por esse motivo, habilitada a dirigir o país. Os próprios presidentes lhe pareciam pessoas inferiores: do presidente ao mais insignificante funcionário, todos tinham de respeitar os industriais e interpretar as leis segundo as exigências do big business.
Os americanos desta época não viam nenhum inconveniente em arruinar os seus concorrentes, sempre que lhes fosse possível, estando prontos a aproveitar todas as combinações para explorar o Estado. O êxito neste domínio valia-lhes o cognome lisonjeiro de smart e a admiração geral.
Ao mesmo tempo, os businessmen irritavam-se com a “imoralidade” da Europa, patente na literatura, sobretudo nos romances franceses considerados “indecentes”. A arte era coisa considerada muito pouco importante e os artistas pessoas mais ou menos suspeitas. Os artistas não só não ganhavam dólares, como também pareciam não os querer ganhar, o que para a época, era quase tão chocante como uma concepção pessimista da vida.
O ideal dos Americanos, após guerra civil, consistia na fortuna ganha, de preferência, pelo próprio possuidor em transacções comerciais de grande envergadura. O americano-modelo devia pertencer ao Partido Republicano e a uma das mais importantes comunidades religiosas, protestante se possível; não devia ter relações com políticos, excepto no interesse dos seus negócios. O “bom” americano esforçava-se por obter um lugar no comité desta ou daquela associação de beneficência e combatia o movimento operário com todas as suas forças. Nenhum cheque era demasiado generoso para as obras de caridade, mas, quando a aumentar os salários, era uma coisa totalmente diferente.
A política não ocupa o primeiro lugar na história da América durante a segunda metade do século XIX. Essa história não é uma lenda, mas um conto de terror que tem como personagens o carvão, o petróleo, a terra, o aço e as acções da Bolsa, a lenda dos enormes recursos naturais que proporcionavam gigantescas fortunas. A história da América nesta época é a história, não dos seus presidentes, mas dos reis do dólar.
(Brevemente há mais)

sexta-feira, outubro 05, 2007

Um desejo pode não ser utopia.

No post anterior falei de um amigo, hoje venho falar de amigos. Por iniciativa do Henrique, foi promovido um concurso de contos, aberto a todos os quisessem participar.
Foi um sucesso, quer pelo número de participantes, quer pelo que foi escrito. Mas como o Henrique não é homem de meias tintas, só de Tinturras, publicou os contos num livro. Perguntei a mim próprio, que levaria este homem a ter um trabalhão destes? Só obtive uma resposta, a amizade.
Desde há muito tempo que sou uma pessoa desiludida com o meu semelhante, por muito que me esforce não consigo justificá-lo. Em muito do que escrevo faço transparecer esse sentimento, que com decorrer do tempo tem vindo a piorar. Já tinha até perdido a esperança, o que a pouco e pouco me tem encurralado no alheamento do que me rodeia.
Graças ao Henrique, descobri que afinal, neste mar de desilusão, ainda havia uma ilha, onde a amizade não era uma utopia. Qual naufrago trôpego, apalpo a areia do calor humano, sentir a segurança do porto da fraternidade e, cansado, descanso no calor da amizade.
Esta é uma espécie de ressurreição de algo que julgava definitivamente morto e, que volta a entrar na minha vida. É um gosto perdido, que volto a saborear, a amizade.
No seu Hora vejamos… voltei a encontrar pessoas, que pensava já não existiam, só nos contos de fadas. A que ponto uma pessoa pode chegar quando fica empedernida contra a desilusão.
Um restaurante em Leiria, foi o local escolhido para a distribuição dos prémios, onde o maior prémio foi o convívio e sã camaradagem. Foi muito gratificante rever alguns e conhecer pessoalmente outros com quem, virtualmente, já vinha estreitando laços de afectuosa amizade, ou ainda outros que o evento juntara.
Festa muito bem organizada, detalhe a detalhe, nada foi descorado. A palavra dita, a música, a troca de autógrafos, a conversa envolvente, a troca de experiências e, nem um bolo alusivo ao evento faltou.
No vídeo que segue, da autoria da minha amiga Ashera, é bom voltar a chamar alguém de amigo, poderão ter uma ideia de como, apesar das vicissitudes da vida, a amizade ainda prevalece.