sábado, junho 11, 2005

Virgílio um poeta actual


Virgílio recitando a Eneida a Augusto
Pintura de Jean August Diminique Ingres



Virgílio era o mais idoso dos poetas que viveram durante o reinado de Augusto, e considerado pelos Romanos o maior. Nasceu em 70 a.C., numa pequena aldeia perto de Mântua, na Gália Cisalpina. Seu pai, um homem simples, esforçara-se para lhe dar uma cuidada educação literária e científica.
Na sua obra poética, Bucólicas, Virgílio canta a vida pastoril. As Bucólicas apresentam a uma geração de cidadãos entregues ao luxo e aos prazeres, o mundo da natureza e da inocência, onde todos aqueles a quem o alvoroço da cidade cansa, podiam encontrar a paz de espírito e a serenidade. Virgílio escreveu os idílicos pastoris quando as grandes batalhas de Filipos acabavam de decidir da sorte do mundo, assim como nos anos que se seguiram. As Bucólicas cantavam uma calma bem-vinda numa época tão perturbada.
No poema IV, o poeta prevê a vinda de uma idade de ouro a seguir às dilacerantes guerras, uma época em que a terra oferecerá aos homens ceifas doiradas, sem sementeiras prévias, em que as vinhas darão vinho sem ser preciso poda-las, em que o «rebanho não mais tremerá diante do leão, a serpente morrerá e o mel correrá como orvalho do tronco dos carvalhos».
Esta idade de paz seria anunciada pelo nascimento de uma criança que reinará como um deus num mundo de abundância. Quem é esta criança cujo nascimento é previsto pelo poeta em termos tão arrebatados? Piedosos cristãos julgaram ver neste poema a primeira luz da estrela que guiou os sábios do Oriente para a manjedoura de Belém. As significativas imagens da Bíblia – o rebanho, os pastores, a serpente que devia morrer – reforçavam-lhes esta convicção: o poeta referia-se a Jesus. Foi o que pensaram os cristãos da Idade Média, considerando Virgílio como um santo profeta.
Não é, evidentemente, inverosímil a hipótese de que Virgílio, muito piedoso, tenha ouvido falar nas profecias de Isaías, nem mesmo que tenha lido os profetas judeus na sua tradução grega.
Contudo, para além da controvérsia que possa existir, um facto subsiste: a maior parte das imagens deste poema de Virgílio provêm de poetas helénicos e helenistas mais antigos, como Píncaro, e de cânticos, universalmente conhecidos, sobre os felizes tempos da idade de ouro. Os discípulos de Platão e de Pitágoras estavam intimamente convencidos do iminente retorno dessa época. Parece que todas estas profecias têm a sua origem no Egipto, o primeiro país culto, berço de misteriosos conceitos místicos.
Seja como for, a realidade é que o poema feito por Virgílio traduz, com uma forma belíssima, a tendência para a perfeição do homem individual e colectivo, exprimindo um profundo sentimento de humanidade, a aspiração à paz, ao amor e à concórdia entre os homens.
Embora a sua previsão se tivesse revelado inexacta, o poema de Virgílio contém um valor permanente e mais do que nunca actual, nesta época infeliz, em que a humanidade manifesta o anseio por um mundo melhor.

A questão continuada publicou a segunda parte do post sobre Sesimbra

9 Comments:

Blogger Luís Sirgado said...

Este comentário foi removido por um gestor do blogue.

11:30 da tarde  
Blogger Luís Sirgado said...

Um poeta extremamente interessante. Cheguei a fazer traduções para português de alguns dos seus poemas. E sem dúvida nenhuma que eram bastante actuais.

[oeureka.blogspot.com]

11:33 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Augusto, fazes renascer o gosto pelos "clássicos" nesta época conturbada..e a esperança dum mundo melhor..e lembrar alguns nossos, como «O Sol é grande, caem co'a calma as aves», de Sá de Miranda, ou «Descalça vai para a fonte» , de Camões...embora os poetas pertençam a toda a humanidade.
Um beijo*

3:10 da tarde  
Blogger BlueShell said...

Gostei.

Vou ver.
Tudo de bom, BShell

1:21 da tarde  
Blogger hfm said...

Gostei de ler.

5:36 da tarde  
Blogger Mitsou said...

Gostei muito. E saí mais rica com o que li. Beijo grande.

12:23 da manhã  
Blogger Menina Marota said...

Um belo texto e uma bela imagem, que gostei de ler e fixei estas palavras:

"...Embora a sua previsão se tivesse revelado inexacta, o poema de Virgílio contém um valor permanente e mais do que nunca actual, nesta época infeliz, em que a humanidade manifesta o anseio por um mundo melhor."

Concordo plenamente!

Um abraço :-)

8:59 da manhã  
Blogger Unknown said...

fiquei curioso em descobrir e lere o que foi escrito nessa epoca.obrigado

9:50 da tarde  
Blogger Osc@r Luiz said...

Gostei muito disso. Tanto que levei para o meu blog. Já estamos em 2007 e ele continua atual.
Um abraço!

7:13 da manhã  

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