Sesimbra
Sesimbra nos princípios do seculo XX. Ainda não tinha sido construida a marginal nem o porto de abriogo
Hoje em dia quando me desloco a Sesimbra, não é sem um doloroso confrangimento, que vejo como a “modernidade” ao serviço do laser, descaracterizou impiedosamente, uma das vilas costeiras mais bonitas de Portugal.
Com o confrangimento fazem coro as saudades de um tempo querido, que eu vivi nos anos 50, quando nessa vila passei várias férias grandes escolares, com a duração de dois meses cada.
É esta Sesimbra, que se perdeu no tempo, que a maior parte das pessoas que a visitam hoje não conhecem, que eu quero relembrar, pelas palavras da memória da criança que fui.
Com o confrangimento fazem coro as saudades de um tempo querido, que eu vivi nos anos 50, quando nessa vila passei várias férias grandes escolares, com a duração de dois meses cada.
É esta Sesimbra, que se perdeu no tempo, que a maior parte das pessoas que a visitam hoje não conhecem, que eu quero relembrar, pelas palavras da memória da criança que fui.
Implantada numa reentrância da orla atlântica do maciço da Arrábida, conheceu o seu primeiro habitante, há cerca de um milhão de anos, o Homo Erectus, quando este chegou proveniente de África. Foi palco da evolução humana durante todo o Paleolítico e Neolítico. No período da Era dos Metais, é visitada pelas civilizações do mundo mediterrânico, Gregos, Fenícios e Cartagineses, com quem estabeleceu contactos.
Também por ela passaram, no período das grandes conquistas, que começaram no século II a.C., os Romanos, as invasões Germânicas, desde os Vândalos aos Visigodos, terminando no século VIII com a invasão dos Árabes vindos do Norte de África, que construíram o primeiro castelo para abrigar o povoado.
Objecto de diversas tentativas de conquista por D. Afonso Henriques, o castelo árabe, éfoi definitivamente conquistado por D. Sancho I, auxiliado pelos cruzados francos, aquém foi doado o povoado. Em 1236, com a doação do concelho de Sesimbra à Ordem de Santiago, a população expande-se para fora das muralhas, criando a povoação da Ribeira de Sesimbra. Mais tarde em 1536, é então criada a vila de Sesimbra, no local que lhe conhecemos hoje, cuja população participou de modo activo na expansão ultramarina. Com a queda dos Duques de Aveiro, últimos representantes da Ordem de Santiago no século XVIII, as terras de Sesimbra, passaram para a tutela real. No século XIX, a vila vai sofrer imensas vicissitudes, desde a conquista napoleónica até à guerra civil de 1834-1836, que levou ao desmantelamento de vários pontos militares costeiros. No final do século XIX e princípio do século XX, assistimos ao renovar da vila de Sesimbra, tornando-se um dos mais importantes e pitorescos portos pesqueiros.
É em meados do século XX que eu faço o meu encontro com Sesimbra, ou melhor com o que dela ainda subsistia das suas tradições como vila piscatória. Durante as minhas férias ficava em casa de uns tios avós maternos, onde moravam também outros familiares, do ramo da tia avó. Todos os homens eram pescadores com a excepção do tio-avô, que era leiloeiro na lota, local onde se vendia o peixe.
Após os meus pais me deixarem em casa dos tios, e regressarem a Lisboa, a primeira coisa que fazia era descalçar os sapatos para só os tornar a calçar dois meses depois. Descalço e em calção de banho de manhã à noite, com liberdade completa de movimentos, era a criança mais feliz que se possa imaginar. O mundo era todo meu, e esse mundo era o mundo do mar e do peixe. Hoje com a escassez que existe é difícil de imaginar a quantidade de peixe que todos os dias era descarregado na praia para vender.
Na praia sim, na que fica à direita do forte se estivermos voltados para o mar e de costas para a vila.
Barcas varadas na rampa por onde peixe saía da paraia, carregado em burros.
O peixe era colocado na praia geometricamente ordenado, fazendo lotes específicos para venda, como no caso do peixe-espada, da albacora, dos safios e das chaputas. Os pargos, gorazes, as corvinas e as pescadas, tinham direito a destaque. Eram colocados em cima de montículos de areia feitos para esse fim.
O carapau, a sardinha, a sarda e a cavala, eram colocados em caixas de madeira próprias e tradicionais, ou vendidos a granel dentro das próprias embarcações. O espadarte, as toninhas e outros peixes de maior porte eram vendidos individualmente.
As baleias nunca soube onde eram vendidas, já não eram da minha época. Não sabiam que em Sesimbra já se caçou às baleias, quando elas viajavam ao longo da costa portuguesa?
Havia, imaginem, duas lotas por dia. A primeira começava por volta das seis da manhã até cerca do meio-dia. A da tarde iniciava-se às seis horas e não tinha hora de terminar, enquanto estivesse a chegar peixe ela não parava, prolongando-se por vezes até às duas da manhã. A lota da manhã era abastecida pela pesca nocturna, a do fim do dia vendia o peixe pescado de tarde. Diariamente passam toneladas e toneladas de peixe fresco pela lota.
Das duas lotas a que mais gostava de participar era na da tarde. Na da manhã limitava-me a ir levar o pequeno-almoço ao meu tio por volta das oito horas, uma leiteira e um pão com manteiga. A lota da tarde, além de mais longa, tinha um encanto muito especial para mim. Depois de cair a noite, por falta de luz artificial, era iluminada com a luz de archotes. É aqui que entrava a minha intervenção. Os archotes eram seguros pelos rapazes da vila, onde eu me incluía, apesar dos protestos do meu tio. Com os pés dentro de água, iluminava-mos a descarga a troco de uma mão cheia de peixe. Eu não precisava do peixe para nada, pois era coisa que não faltava em casa, mas dava-me um prazer enorme ver o meu trabalho recompensado, fazia-me sentir como se fosse um deles.
O peixe à medida que era vendido, era retirado da praia o mais rápido possível, para dar lugar ao que se seguia. Praia cheia, praia vazia durante horas, enquanto durava a descarga do peixe.
O peixe vendido era transportado dentro de caixas, por burros com umas cangalhas especiais para o efeito. Da praia, os burros subiam por uma rampa até o largo da vila sobranceiro ao mar, onde as camionetas dos comerciantes esperavam para serem carregadas.
Ao largo ficavam os barcos de pesca, de que falarei mais adiante, que transbordavam o peixe para pequenas embarcações, as típicas aiolas, que o traziam para terra onde a azáfama era enorme. As aiolas a varar na praia, puxadas pelos homens com as calças arregaçadas, aproveitando o auxílio das ondas, a descarga, o alinhamento do peixe na lota, a venda e por fim a corrida dos burros, que ganhavam ao trajecto.
A música de fundo, protagonizada pelos barítonos pregoeiros, era um imenso e inconfundível coro de vozes e gritos dos participantes desta labuta diária. Tudo isto, sublimemente odorizado, com o cheiro do peixe fresco e da maresia de um mar tão generoso.
Também por ela passaram, no período das grandes conquistas, que começaram no século II a.C., os Romanos, as invasões Germânicas, desde os Vândalos aos Visigodos, terminando no século VIII com a invasão dos Árabes vindos do Norte de África, que construíram o primeiro castelo para abrigar o povoado.
Objecto de diversas tentativas de conquista por D. Afonso Henriques, o castelo árabe, éfoi definitivamente conquistado por D. Sancho I, auxiliado pelos cruzados francos, aquém foi doado o povoado. Em 1236, com a doação do concelho de Sesimbra à Ordem de Santiago, a população expande-se para fora das muralhas, criando a povoação da Ribeira de Sesimbra. Mais tarde em 1536, é então criada a vila de Sesimbra, no local que lhe conhecemos hoje, cuja população participou de modo activo na expansão ultramarina. Com a queda dos Duques de Aveiro, últimos representantes da Ordem de Santiago no século XVIII, as terras de Sesimbra, passaram para a tutela real. No século XIX, a vila vai sofrer imensas vicissitudes, desde a conquista napoleónica até à guerra civil de 1834-1836, que levou ao desmantelamento de vários pontos militares costeiros. No final do século XIX e princípio do século XX, assistimos ao renovar da vila de Sesimbra, tornando-se um dos mais importantes e pitorescos portos pesqueiros.
É em meados do século XX que eu faço o meu encontro com Sesimbra, ou melhor com o que dela ainda subsistia das suas tradições como vila piscatória. Durante as minhas férias ficava em casa de uns tios avós maternos, onde moravam também outros familiares, do ramo da tia avó. Todos os homens eram pescadores com a excepção do tio-avô, que era leiloeiro na lota, local onde se vendia o peixe.
Após os meus pais me deixarem em casa dos tios, e regressarem a Lisboa, a primeira coisa que fazia era descalçar os sapatos para só os tornar a calçar dois meses depois. Descalço e em calção de banho de manhã à noite, com liberdade completa de movimentos, era a criança mais feliz que se possa imaginar. O mundo era todo meu, e esse mundo era o mundo do mar e do peixe. Hoje com a escassez que existe é difícil de imaginar a quantidade de peixe que todos os dias era descarregado na praia para vender.
Na praia sim, na que fica à direita do forte se estivermos voltados para o mar e de costas para a vila.
Barcas varadas na rampa por onde peixe saía da paraia, carregado em burros.
O peixe era colocado na praia geometricamente ordenado, fazendo lotes específicos para venda, como no caso do peixe-espada, da albacora, dos safios e das chaputas. Os pargos, gorazes, as corvinas e as pescadas, tinham direito a destaque. Eram colocados em cima de montículos de areia feitos para esse fim.
O carapau, a sardinha, a sarda e a cavala, eram colocados em caixas de madeira próprias e tradicionais, ou vendidos a granel dentro das próprias embarcações. O espadarte, as toninhas e outros peixes de maior porte eram vendidos individualmente.
As baleias nunca soube onde eram vendidas, já não eram da minha época. Não sabiam que em Sesimbra já se caçou às baleias, quando elas viajavam ao longo da costa portuguesa?
Havia, imaginem, duas lotas por dia. A primeira começava por volta das seis da manhã até cerca do meio-dia. A da tarde iniciava-se às seis horas e não tinha hora de terminar, enquanto estivesse a chegar peixe ela não parava, prolongando-se por vezes até às duas da manhã. A lota da manhã era abastecida pela pesca nocturna, a do fim do dia vendia o peixe pescado de tarde. Diariamente passam toneladas e toneladas de peixe fresco pela lota.
Das duas lotas a que mais gostava de participar era na da tarde. Na da manhã limitava-me a ir levar o pequeno-almoço ao meu tio por volta das oito horas, uma leiteira e um pão com manteiga. A lota da tarde, além de mais longa, tinha um encanto muito especial para mim. Depois de cair a noite, por falta de luz artificial, era iluminada com a luz de archotes. É aqui que entrava a minha intervenção. Os archotes eram seguros pelos rapazes da vila, onde eu me incluía, apesar dos protestos do meu tio. Com os pés dentro de água, iluminava-mos a descarga a troco de uma mão cheia de peixe. Eu não precisava do peixe para nada, pois era coisa que não faltava em casa, mas dava-me um prazer enorme ver o meu trabalho recompensado, fazia-me sentir como se fosse um deles.
O peixe à medida que era vendido, era retirado da praia o mais rápido possível, para dar lugar ao que se seguia. Praia cheia, praia vazia durante horas, enquanto durava a descarga do peixe.
O peixe vendido era transportado dentro de caixas, por burros com umas cangalhas especiais para o efeito. Da praia, os burros subiam por uma rampa até o largo da vila sobranceiro ao mar, onde as camionetas dos comerciantes esperavam para serem carregadas.
Ao largo ficavam os barcos de pesca, de que falarei mais adiante, que transbordavam o peixe para pequenas embarcações, as típicas aiolas, que o traziam para terra onde a azáfama era enorme. As aiolas a varar na praia, puxadas pelos homens com as calças arregaçadas, aproveitando o auxílio das ondas, a descarga, o alinhamento do peixe na lota, a venda e por fim a corrida dos burros, que ganhavam ao trajecto.
A música de fundo, protagonizada pelos barítonos pregoeiros, era um imenso e inconfundível coro de vozes e gritos dos participantes desta labuta diária. Tudo isto, sublimemente odorizado, com o cheiro do peixe fresco e da maresia de um mar tão generoso.
17 Comments:
Bons tempos.... que não conheci mas que gostava de ter conhecido !
Beijinhos verdinhos
Também vou algumas vezes a Sesimbra. A vista cá de cima é de cortar a respiração. Quanto à descaracterização, é infelizmente uma triste realidade. Não há muito tempo, calhou ir lá durante um dia de semana e gostei da calma da vila. Talvez um bom sítio para se viver e trabalhar, mas não para passar férias.
grande post augusto sobre um sitio que eu adoro visitar. boas fotos que documentam o artigo.
obrigado pelos parabens.
beijinhos
Sesimbra é linda sim.
Gostei de ler as tuas descrições elaboradas com a força que as boas recordações exigem. O melhor lugar do mundo é o da nossa juventude.
Abraço
venho soltar o pregão do regresso.
contigo. às marés de uma terra que conheci diferentemente. também.
e que merece este "postar".
a ti deixo um remo. seguro. sempre.
como a tua Amizade.
que agradeço.
e retribuo.
sempre.
beijo.
É preciso ser muita estúpido ó Augusto para não ter percebido JÁ que a Isabel Mendes Ferreira é amiga dos seus "amigos" Pinto Ribeiro e Cpª
Ela é do pior que há.
Ainda não deu para perceber ó anjinho?
Vá investigar e deixe-se de figuras ridículas, "babando-se" quando escreve comments a essa senhora.
Senhora entre aspas, que de senhora só tem o nome.
Auguri tanti
Suck and Smile e outros a quem você Desancou há uns tempos.
Tudo farinha do mesmo saco.
Anjinho
Ridículo
Sesimbra sofre de uma "coisa" cada vez mais comum entre nós...a falta de memória histórica. o que fizeram e fazem a Sesimbra podiam fazer ao lado..e manter a vila intacta...mas não...
olha qd souber o local digo-te
abraço
Santo Augusto
Informação adendada:
essa tal Isabel Mendes Ferreira diz mal de si, da sua família, inclusive da sua filha.
Essa dama do lago anda em tratamento psiquiátrico e não os outros que els diz andarem.
Mente constantemente, faz-se passar por outras pessoas, compartilha telemóveis, é completamente maluca.
Só vive de aparências, passa o tempo na net.
É superficial, tarada, inventa coisas, difama outros. A Wind foi uma vítima das bocas dela.
Vá-se curar você tb, não vê o evidente?
É preciso ser bronco.
Quem avisa seu amigo é!
Gosto mais de Sesimbra do antigamente, actualmente mete nojo.
O texto muito bom, mas já o tinha lido na Questão Continuada.
Boa tarde, sr. Augusto.
Que saudades de algumas vezes que fui a Sesimbra...
Tenho um grande amigo em Azoia - Sesimbra.
Um dia tenho que rever essas "paragens"....e a praia do «Meco» Rissssssssss.
Abraço
volto. em tempo de tantos "voos" que por aí se fazem.
apenas para agradecer.
a constância. a elegância.
beijo.
tambem por lá passei, férias em anos consecutivos, mas cansei... tornou-se absolutamente sufocante e é pena...
no entanto, a nostalgia da terra em tempos menos turbolentos é aprazível e já agora, os textos prendem até ao fim...
abç
Querido amigo... estava meio ausente nas duas últimas semanas, mas já estou de volta a ativa e com muitas saudades...
Deixo-te beijos, flores e muitos sorrisos!
Então já chegou a alguma conclusão acerca do que lhe disse?
Continua a comentar a "dama"?
No big deal, cada um come do que gosta...
Augusto,
Vejo a forma emocionada como falas de Sesimbra. Não da Sesimbra dos nossos dias, mas da tua Seimbra, da Sesimbra da tua infância.
São esse tipo de recordações que nos valorizam, e que nos ajudaram a ser o que somos hoje. Sinto nas tuas palavras a amragura por a tua Sesimbra se ter transformado na Sesimbra do turismo, mas é inevitável isso acontecer em todo o lado, porque a ganância pelo dinheiro, e pela modernidade, acabam por destruir tudo que de bom e de histórico tem cada lugar.
Bom domingo.
Abraço.
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