O Tempo e a Verdade
Verdade é um saber que, devido à convicção, achamos irrefutável. Todos a procuram, acabando por conceber a sua ou adoptar como sua a verdade de outrem.
O desejo de conhecer a Verdade tornou-se no principal fundamento da humanidade à medida que toma consciência de si própria, isto é, se vai individualizando da Natureza.
A humanidade, enquanto parte integrante da Natureza, sem consciência do todo harmonioso e interactivo de que fazia parte, o Tempo não existia, não havia verdades a saber, a inconsciência da sua existência, diluía-se no Todo Natural.
Com aquilo a que chamamos evolução, a humanidade atingiu o seu primeiro e maior estágio evolutivo ao reconhecer a sua própria existência. Deixar de fazer parte inconsciente do Todo, para se individualizar dele e, consciente de si própria, tornar-se-lhe exterior.
Assim, a evolução é a manifestação de um egoísmo em relação à Natureza, que leva a não se considerar parte integrante, e como tal, superior.
A separação do homem da Natureza, tem como consequência primeira a criação do Tempo. Passou do intemporal para o temporal.
Na Natureza a noção de Tempo não existe, a “existência” é intemporal, sem princípio nem fim, somente as mutações constantes são a sua própria essência. Na Natureza “nada se perde, nada se ganha, tudo se transforma”, nenhum fim ou princípio está presente, só a mutação.
Com a humanidade, apesar da sua pertença individualização em relação à Natureza, acontece o mesmo, a essência que a rege, o ADN, não desaparece, prossegue a sua existência passando de hospedeiro para hospedeiro.
A Natureza é um Todo incriado, como tal nada pode ser acrescentado nem nada lhe pode ser retirado. Ela interage com ela própria.
A criação do Tempo acontece quando a humanidade ao reconhecer a sua existência, adquire a noção do nascimento, da vida e da morte, as primeiras etapas da cronometragem do tempo. Estas são as suas primeiras verdades.
Verdades temporais, que nada têm a haver com a Verdade intemporal, inatingível pela temporalidade.
Uma existência individualizada da Natureza, sem Tempo, é impossível, pois ele é a sua definição. Imaginar uma existência sem Tempo, era imaginar conhecer a Natureza e a Natureza só ela se conhece a si própria.
Acantonada no sensitivo, o mesmo que dizer no temporal, a humanidade nunca poderá ter consciência do todo em que está inserida, a sua individualização origina a criação.
O cognoscível fundamenta-se num criador, a “verdade”, e para atingir essa verdade, cria a temporalidade sujeitando a ela toda a “existência”.
Temporalidade é condicionar tudo a um princípio e um fim, estabelecer uma “verdade”, como se o incognoscível pudesse passar a ser cognoscível, ou seja, a Natureza compreender-se a ela própria.
Existir na existência, querer ter consciência dentro da inconsciência, é o “pecado original” da Natureza, crer ser a criadora de si própria, porque ao criarmos a criação, implicitamente somos o próprio criador. Nós seríamos a Verdade em si mesma.
Esta veleidade da humanidade paga-se caro, ficarmos prisioneiros do Tempo, regidos pelo Tempo, condicionados pelo Tempo, criando tantas “verdades” quantas as existências, em que a multiplicidade é a própria negação da verdadeira Verdade.
Seremos um acaso ou erro da própria Natureza?
Penso que não, admito mais sermos a consciência que a Natureza tem de si, ou por outras palavras, a Natureza a questionar-se a ela própria.
A temporalidade com a sua noção de princípio e de fim, aspira eternizar-se procurando a compreensão do primeiro para medicar o segundo.
O regresso à intemporalidade só será possível com o desaparecimento do temporal e, tal só pode acontecer, se a Natureza retroceder, se aquilo a que chamamos evolução nunca tivesse acontecido.